Avaliação e regulação no ensino superior: desafios para o novo governo

05/09/2016 15:32

Avaliação e regulação no ensino superior: desafios para o novo governo

Em Artigos
Por prof. Paulo Cardim
“Ensinar exige rigorosidade metódica” (Paulo Freire)
“Avaliar também” (Paulo Cardim)
Com a cassação do mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, chega ao fim a interinidade do presidente Michel Temer. Efetivado na condução da Presidência da República, Temer e seus ministros podem – e devem – planejar as estratégias, metas e ações governamentais para o biênio 2017/18, além de iniciar, de imediato, ações necessárias a colocarem “nos trilhos” o governo federal.
Na área da educação, a prioridade deve ser o cumprimento do Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado pela Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. As 20 metas e respectivas estratégias do PNE-2014-2024 estão em “compasso de espera” há mais de dois anos. O Sistema Nacional de Ensino, uma das estratégias para fazer as unidades federativas e os municípios atuarem coordenadamente no cumprimento de metas na educação básica, tem propostas confusas, até agora conduzidas com o vírus ideológico, que nada constrói.
Na área da educação superior, o desafio do ministro da Educação, Mendonça Filho, e de sua equipe é recolocar nos trilhos o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, o Sinaes, aprovado pela Lei nº 10.861, de 2004. A criação de espúrios indicadores, como o Conceito Preliminar de Cursos (CPC) e o Índice Geral de Cursos (IGC), deve ser revista, a fim de restaurar a credibilidade das avaliações in loco de IES e de seus cursos de graduação, com as normas delineadas pelo Sinaes. O Exame Nacional dos Estudantes (Enade) foi desvirtuado de suas finalidades ao longo dos anos de sua implantação. O Enade não avalia o curso, mas o “desempenho dos estudantes em relação aos conteúdos programáticos previstos nas diretrizes curriculares do respectivo curso de graduação, suas habilidades para ajustamento às exigências decorrentes da evolução do conhecimento e suas competências para compreender temas exteriores ao âmbito específico de sua profissão, ligados à realidade brasileira e mundial e a outras áreas do conhecimento” (Art. 5º § 1º). O questionário aplicado aos estudantes que participam do Enade tem por objetivo “levantar o perfil dos estudantes, relevante para a compreensão de seus resultados” (Art. 5º, § 4º) e não avaliar o curso. Esses equívocos e desvio de rumos devem ser revistos. Cabe à Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes) reassumir sua competência e atribuição, delineada pela Lei do Sinaes, deliberando sobre as normas de avaliação institucional e de cursos, com a definição dos indicadores e dos critérios de avaliação e os pesos de cada eixo ou dimensão, além de disciplinar a oferta do Enade e os critérios de avaliação dos estudantes, conforme dispõe o art. 6º da Lei nº 10.861/2004. Ao Inep cabe a responsabilidade de avaliar as IES e seus cursos de graduação e aplicar o Enade (Art. 8o), mas não as atribuições de construir indicadores e critérios de avaliação, estes, privativos da Conaes.
Falta aplicar corretamente o art. 10 da Lei nº 10.861/2004. Nos processos de supervisão, a IES é obrigada a firmar um “protocolo de compromisso” com o MEC, quando os resultados das avaliações institucionais e de cursos de graduação forem “considerados insatisfatórios”, nos estritos termos do mencionado art. 10. Até agora esse dispositivo do Sinaes foi totalmente ignorado, tomando-se por base para a assinatura dos protocolos de compromisso as notas “insatisfatórias” do IGC e do CPC, indicadores não previstos pela referida Lei. Por outro lado, há processos de supervisão tramitando com a lentidão das lesmas, com prejuízos irremediáveis às IES envolvidas. Essa morosidade é injustificável.
O Decreto nº 5.773, de 2006, e a Portaria Normativa nº 40/2007, “republicada” no final de 2010, por ter havido “incorreções” na publicação original, são dois atos que trouxeram insegurança jurídica para as instituições de ensino superior (IES), públicas ou da livre iniciativa, além de levar os gestores do MEC a confundirem regulação com avaliação. O Decreto nº 8.754, publicado no dia 10 de maio findo, data da suspensão do mandato da presidente Dilma Rousseff, que altera diversos dispositivos do citado Decreto nº 5.773, merece a revogação pura e simples, por ser uma colcha de retalhos com a mancha ideológica e a discriminação entre público e privado.
Outro desafio para o ministro Mendonça Filho é fazer funcionar a máquina burocrática nos processos de regulação – credenciamento e recredenciamento de IES e autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento de cursos. Existem processos com mais de cinco anos de tramitação. O passivo do MEC, nessa área, é assustador, prejudicando, em particular, as faculdades, que não possuem autonomia para autorizarem o funcionamento dos cursos de graduação, a sua área prioritária de atuação.
Há, contudo, uma questão maior que, para ser resolvida, não depende apenas do ministro Mendonça Filho, mas da Presidência da República e do Congresso Nacional. Trata-se da alcunhada lei “Mais Médicos” que, em princípio, seria destinada a estabelecer normas para a formação de recursos humanos na área médica “para o Sistema Único de Saúde (SUS)”. Com esse pretexto, criou-se um processo de licitação pública para a autorização de cursos de graduação em Medicina, contrariando o artigo 209 da Constituição, que dispõe que o “ensino é livre à iniciativa privada”, com o “cumprimento das normas gerais da educação nacional” e das de “autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público”. Essas normas estão perfeitamente delineadas em Lei – a LDB, 9.394/1996, e o Sinaes, 10.861/2004.
São desafios para o ministro Mendonça Filho e o presidente da República, Michel Temer, que devem ser enfrentados e superados corajosamente nesses próximos dois anos. Caso isso aconteça, vão legar à educação superior uma legislação segura e submissa à Constituição, partindo-se do princípio de que “Lei é Lei”; lei não é decreto, portaria, resolução, parecer, nota técnica ou despacho, como vinha sendo entendido e aplicado pelos diversos ministros da Educação.
“É mais fácil governar um povo culto, cioso de suas prerrogativas e direitos, que tem nítida a compreensão de seus deveres, que um povo ignaro, indócil, sem iniciativa e inimigo do progresso”.
“O papel da instrução é preparar e formar homens capazes e úteis à sociedade; o papel do governo é fornecer meios fáceis de se adquirir a instrução, disseminando escolas e patrocinando iniciativas boas confiadas à competência e ao amor por tão nobilitante tarefa”.
Prof. Carlos Alberto Gomes Cardim
Diretor da Escola Normal “Caetano de Campos”
Educador e Inspetor de Alunos, 1909
Irmão do fundador do
Centro Universitário Belas Artes de São Paulo
Fonte: belasartes.br/diretodareitoria
 

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