Instituições, crescimento e justiça social (Artigo)

22/05/2015 14:28

Instituições, crescimento e justiça social (Artigo)
O Brasil melhorou bastante em termos sociais nas últimas duas décadas, com avanço educacional, redução da pobreza, desemprego, informalidade, desigualdade e mortalidade infantil e aumento dos salários dos trabalhadores menos qualificados. Entretanto, esses avanços começam a dar sinais de esgotamento, com elevação do desemprego e estagnação dos salários reais. Por que será que o Brasil não consegue crescer com justiça social durante longos períodos de tempo, como os países desenvolvidos?
O problema é que nosso país não consegue combinar crescimento da produtividade com avanço social. A figura ao lado mostra isso claramente, ao comparar o crescimento da produtividade industrial e dos anos médios de escolaridade no Brasil e na Coreia em dois períodos recentes da história dos dois países: 1965-1980 e 1980-2010.
As tarifas de importação subiram, protegendo a mesma indústria que teve desempenho pífio em produtividade.
Podemos observar que no primeiro período a produtividade da indústria brasileira dobrou, mas praticamente não houve crescimento da escolaridade. Isso provocou um grande aumento da desigualdade de renda no Brasil, na medida em que apenas uma pequena parcela da população tinha ensino superior, ao mesmo tempo em que o processo de industrialização aumentava a demanda por trabalhadores mais educados. Enquanto isso na Coreia os anos médios de escolaridade aumentaram cerca de 50% no mesmo período.
No período seguinte, 1980 a 2010, a situação brasileira inverteu-se. Com o processo de redemocratização, houve um avanço educacional, principalmente em termos de acesso e permanência na escola. Além disso, a aceleração dos programas de transferência de renda e o crescimento do valor real do salário mínimo fizeram com que a desigualdade de renda diminuísse bastante no período. Vale notar, porém, que mesmo no período mais recente o crescimento educacional brasileiro ocorreu em ritmo muito inferior ao da Coreia.
Entretanto, o crescimento da produtividade da indústria brasileira foi praticamente zero nos últimos 30 anos, enquanto na Coreia ela aumentou mais de 400%. Isso significa que cada trabalhador na indústria brasileira produz hoje o mesmo que em 1980, enquanto um trabalhador coreano produz cinco vezes mais do que naquela época. Por que será que o Brasil não decolou em termos de produtividade, apesar da melhora educacional que houve no período recente? O que está faltando para o Brasil ingresse no grupo de países bem-sucedidos?
Os economistas Acemoglu e Robinson escreveram recentemente um livro muito aclamado ("Why Nations Fail") que diz que as nações permanecem pobres quando não têm "instituições inclusivas", que permitem que a grande maioria da população participe das decisões políticas e das atividades econômicas, tenham a possibilidade de desenvolver suas habilidades e fazer as escolhas que quiserem na vida. Segundo os autores, para que isso ocorra a Justiça tem que ser realmente cega, os serviços públicos têm que igualar as oportunidades de todos, os contratos e a propriedade privada têm que ser respeitados e o mercado tem que incentivar a entrada de novas firmas para quebrar os monopólios.
No final do livro os autores destacam a experiência recente brasileira como um caso de sucesso de transição de uma sociedade extrativista para uma sociedade inclusiva. O processo de redemocratização, a Constituição cidadã, a redução das desigualdades e a inclusão do país no grupo de países com maior potencial de crescimento (Brics) seriam a prova de que o Brasil finalmente estava no caminho certo. O que deu errado?
Na realidade, o Brasil trilhou somente uma pequena parte do caminho para se tornar uma sociedade realmente inclusiva. Sabemos que ainda estamos longe de ter uma Justiça cega, contratos respeitados e igualdade de oportunidades. Os subsídios e diversos mecanismos de proteção para as elites econômicas, a dificuldade para quebrar monopólios, os escândalos frequentes de corrupção e a baixa qualidade da nossa educação demonstram isso claramente. Todos esses fatores fazem com que o crescimento da produtividade seja muito baixo no Brasil.
Ainda nesta semana as tarifas de importação foram aumentadas mais uma vez, protegendo a mesma indústria que teve desempenho pífio em termos de produtividade e inovações nos últimos trinta anos. Grande parte do nosso grande problema fiscal atual resulta da tentativa de proteger nossa elite econômica ao mesmo tempo em que os gastos sociais são ampliados. Tudo indica que Acemoglu e Robinson estavam exageradamente otimistas com a sociedade brasileira.
Naercio Menezes Filho, professor titular - Cátedra IFB e coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, é professor associado da FEA-USP, membro da Acadêmica Brasileira de Ciências e escreve mensalmente às sextas-feiras. naercioamf@insper.edu.br
VALOR ECONÔMICO -SP  OPINIÃO  Artigo 22/05/2015

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